quarta-feira, dezembro 19, 2012

Last Time I Said...


era um poema mais ou menos assim.
você ia embora
e eu te dizia volta
mas você continuava indo
e não havia cristo que te fizesse
mudar de ideia
você ia sempre, sempre mesmo
alucinada com seus passos trotando
era como um desses puros-sangues
em doses cavalares eu chorava
e dizia volta, marcela
embora seu nome fosse maria
e soluçando eu ficava louco
mas era mentira
você era uma enorme aquarela
que eu pintei nos meus costumes
sim, baby, colori borboletas dentro
de mim
para te dar a impressão
de que estava apaixonado
mas no fim eu só queria mesmo
era fingir um romance
como num poema mais ou menos assim...
mas, relaxa, baby.
O mundo não digere nossa ordem.
Dança sozinha,
Te abriga em você.
Porque, no fim,
Só de ti se lembrarás.

domingo, dezembro 16, 2012

canção para quando chegar o fim

quando chegar o fim do mundo, nêga
te chamo pra uma janta
acendo teu cigarro
beijo tua boca
te compro um anel
depois te despeço
e te mando pra bem longe
quando for a hora de dizer adeus.

quando for a hora de dizer adeus, nêga
direi em sã consciência
mas voz embargada
e de canto de olho
que é pra não sentir saudades
desse tempo pouco
e com jeito morno
que carrego no bolso da camisa
vou indo pra não sei onde.

vou indo pra não sei onde, nêga
mas não te levo não
que a vida é curta pra algum romance
e o mundo é grande pra só nós dois
me deixe a sós com meu pensamento
e vê se te arranja alguma coisa boa
e se preocupe com nossas quinquilharias
que um dia eu volto pra te visitar.

que um dia eu volto pra te visitar, nêga
trazendo nas mãos um pedaço de amor
e a boca cheia de afetos
te levo pra um parque
te mimo e consolo
te digo coisas bonitas
e vê se me aceita
pois beleza a gente não nega,

nêga.

sexta-feira, dezembro 14, 2012

o nascimento da tragédia

o anjo foi um
teste de farmácia
que deu positivo
e a mãe
dava bom dia aos cavalos
quando o guri nasceu
num barraco de pau-a-pique
vieram uns curiosos
ter com o pai
se metendo na vida alheia
querendo impôr costumes
mas o velho tava no seu canto
bebendo um uísque barato
pensando na vida fodida que teria
por causa do nascimento
desse moleque
que chorava o dia inteiro
e dormia noite afora
e vieram os muambeiros
oferecer coisas da china
barganhando promessas
inventando desculpas
beberam todos cerveja barata
oferecendo um pouco ao santo
virando num gole só
em homenagem ao menino
o próprio deus surgiu
-de tanto convidarem!
e também tomou uns goles
e também fumou uns tragos
depois disse que ia comprar cigarro
e sumiu na vida
continuaram enchendo a cara
o resto da noite
e por anos
até a mãe dar no pé
até o pai ser demitido
e  as coisas continuarem
de acordo com a ordem natural
da existência
sempre comemorando o nascimento
desse menino que crescia
e que era santo
mesmo fazendo o diabo
e que era gente
mesmo não tendo registro.

terça-feira, dezembro 11, 2012

Poema irritadiço

Não sou eu quem vai
escrever a última rima
pra você, turista literário
vir tirar foto e fazer pose
de que entende do que eu digo.
Meu verso tem arestas
e tangentes
corta estreito e fere torto
tome tento, sujeito decente
que se te pega essa palavra
faz de ti coisa pouca
faz de ti sujeito comum.
Minha poesia não te pede licença
nem quer te servir de amuleto.
De beleza nem o intento
de erudito só a farsa.

Por isso vou assim, eu com minhas tralhas
e me deixe ser poeta
porque na hora que a coisa apertar
é meu verso livre que te olha na cara
e te dá o beijo de redenção.

sábado, dezembro 08, 2012

Algumas coisas que se perdem quando as notamos

                     Minha mão está suja. Preciso cortá-la.
                                                    (Carlos Drummond)


tenho as mãos sujas
de tinta
de impressões
e o meu papel não é
ser como sequer
ser como talvez fui

as linhas dessas duas mãos
que
por ocasião
formam um par solitário
são feitas de fugas e escapam
tangentes
erosivas
e se ocupam de futuros
apontam
afirmam
impedem
resistem
e são mãos de quem se sabe

tenho dedos nervos e marcas
que identificam minhas mãos
e protocolam
organizam
registram no mundo
em alguma parte da história do universo
relatos de expressões quaisquer
tão íntimas e reais
quanto as possibilidades de tocar o infinito

domingo, dezembro 02, 2012

Samba Cancioneiro

Era só a possibilidade de um sorriso teu
Era a desigualdade do teu corpo, e o meu
Era só um minuto de amor em frases já cansadas,
Em teses rejeitadas, de paixão ou não sei.
Era só “a quem interessar possa”
Era a hora tão triste hora da troça
Era só um minuto de amor em frases enciumadas,
Eu que não repito palavras, se é paixão eu não sei.

É só um desses sambas-cancioneiros,
Há de ser a bossa de estrangeiros,
tocada num Steinway pra você.
É só um termo composto,
Com o posto de gosto,
De mim e você.

Era só a verdade cantada, em firma registrada
Era mentira calada, em fraude magistrada
Era só um segundo de farsa e agora passou,
E o que ficou, não foi paixão.
Era só minha “Coletânea de Canções de Amor”
Era nosso coração que dividiu a dor.
Era só o adeus que partiu e que agora voltou,
E se instalou, só paixão, foi só.

É só um desses sambas-cancioneiros,
Há de ser samba sem pandeiro,
Cantado pra você.
É só um desses sambas-sem-dinheiro,
Feito puro e inteiro,
Só pra você.